“Agora posso olhar para ti em paz, não te como mais."
Kafka (para um peixe no aquário)
Ela é meio maluca! Desequilibrada... ciumenta... insegura... - disse-me, enquanto apagava repetidamente o cigarro no cinzeiro, como se quisesse sublinhar as palavras.
A tarde estava fria na esplanada. O Inverno há muito que andava por cá e apenas uma massa disforme e escura de pessoas, metidas nas suas vidas, passava para cima e para baixo. Alguns turistas, dos quais conseguia distinguir uns narizes vermelhos do frio do final de tarde, por entre gorros, luvas e objectivas. E o céu azul. Sempre o céu azul. Azul bem escuro.
E fiquei a pensar nisso. Foi como se conhecesse a personagem daquela história infinitamente bem. Como se já tivéssemos dividido qualquer ponta de loucura.
Existem pessoas capazes de tirar cá para fora o pior de nós... - atirei eu para o ar, a tentar ser correcta e imparcial, contrariando tudo aquilo em que acredito - Deve ser só uma fase má!
Fingi que me importava? Sim, fingi. Mas não me importava nada. Nada! Mesmo nada!!!
Percebi que não sou correcta, nem imparcial e que sou bruta e que coço os tomates e que cuspo para o chão.
E devia ter-te dito isto. Mas não disse. E assim, a personagem da tua história vai ter que ser tal como a descreveste, até à última página.