Tinha guardado aquelas cartas, pedaços de papel, riscados por ti, que na altura procuravas as palavras certas... na altura em que ainda acreditávamos que existiam... e que não querias que sentisse falta de verbos quentes e amorosos, conjugados nas únicas pessoas que existiam, eu e tu.
Li-as todas. São tantas! Tempos houve em que me pareceram tão poucas. Engraçado isto. Mas sim, li-as todas. E se mais fosse preciso para me esclarecer, ali está a prova que vivemos juntos e afastados tempo demais. E admiro-nos pela persistência. E pela juventude. E pela graciosidade da inocência.
Gosto mais de mim agora. Entendo-me melhor. Perdoo-me mais e dou-me mais espaço. Naqueles dias fazia este esforço apenas para ti. E tu, deves partilhar isto comigo. Também deves gostar mais do ser humano, da pessoa que és.
Não falamos faz muito. Mas dizer o quê? A conversa sobre meteorologia aliada a uma compensação social?
Agora que já não temos verbos para conjugar apenas somos dois estranhos que dividiram o passado.
Este fim-de-semana dei de caras com um antigo namorado, daqueles que eram mesmo paixões profundas, ou não tivesse eu na altura quinze anos. Dei de caras com ele e com o respectivo rebento, uma criatura já para aí com dez anos.
Está careca e mais gordo. Mas pareceu-me bem. Não sei se feliz, mas bem.
Pensei em mim. E nele. Há dezassete anos atrás estávamos os dois no mesmo sitio, partilhávamos gostos e opiniões. Éramos "iguais".
Agora nem por isso.
Ele deve ter feito o que todas as pessoas crescidas fazem: casou, teve filhos e deve ter um empréstimo ou dois. Eu, por outro lado, faço as mesmas coisas que fazia aos quinze anos: estou com os amigos, saio à noite, vou viajar. A única diferença que vejo é que agora trabalho em vez de estudar e tenho mais liberdade e mais dinheiro.
E isto deixou-me feliz!
"Porra T." - pensei - "Do que tu te livraste!!!"
Se todos gostássemos do amarelo, o que seria do azul...