Hoje, na minha hora de almoço, três meninas que já foram minha alunas {mas que agora já têm 9 anos} vieram ter comigo e, em estilo de declaração de amor, disseram: "T., temos muitas saudades tuas!! De estar na tua sala!". E plim!, babei-me {de amor}.
Há dias em que professor rima com amor.
" O Passos Coelho é um ladrão. A minha mãe disse-me que ele rouba as pessoas. E a minha mãe disse-me que ele te rouba a ti também T.! Eu não gosto dele. Ele é um ladrão e quando ele vier cá à nossa escola dou-lhe um murro e um pontapé!"
R., 4 anos e meio
{sou uma educadora cheiiiiiinha de orgulho eu...}
Descobri hoje (sim, só hoje...) que o mundo vai acabar dia 21 de Dezembro de 2012. E fiquei deveras aborrecida. Não pelo facto de o mundo acabar mas pela data.
Ó entidade-que-vai-acabar-com-o-mundo, não consegues adiantar a coisa para eu não ter que fazer a tão chata, maçadora e patética festa de natal do colégio? Sim? (Lá para o dia 5 de Dezembro está bem para mim).
Obrigada.
O universo, que até tem sido muito meu amigo, revelando algum entendimento entre nós, resolveu, este ano lectivo, encher a minha existência de aborrecimento e irritação. E mais do que é costume.
Sabem aquelas pessoas que nem sequer precisam de abrir a boca para nos irritar, que só a sua presença dá vontade de lhes partir uma cadeira na cabeça? Aquela criatura tem este dom, de tal forma que eu ando para aqui numa irritação só e depois quem paga é o Passos Coelho (gozo com ele e chamo-lhe nomes e tal...).
Senhora criatura, a sua cria é adorável e fofinha e inteligente e fantástica, mas não é o único ser vivo e especial que tenho na sala. Nós já sabemos que ela vai ser assim qualquer coisa de espectacular daqui a 20 anos mas não me massacre, sim? Não é por a sua cria aos quatro anos não saber o que é um ovíparo ou um bípede que ela dentro de 20 anos não vai governar o mundo e mandar em todos nós, boa? Deixa-a dizer galinha como todas as outras crianças, tá? Deixe-a ser criança,ser feliz e não se preocupe tanto com merdas que não interessam nada, nem a ela nem a mim, ok? E não seja snob e arrogante, porque se eu continuar a conversar com o universo qualquer dia cai-lhe um piano, bigorna ou cofre em cima, tendo em conta que seria difícil não acertar, pois o diâmetro não será considerado dificuldade, got it?
Num destes dias arrastaram-me, com promessas de um jantar de sushi e de sangria, para uma palestra do Eduardo Sá. Gosto daquilo que diz, não tanto pelo conteúdo em si, mas porque me põe a pensar e isso, por si só, é positivo.
Dizia ele (suscitando um aplauso de algumas pessoas do público) que as Educadoras de Infância deviam ser tão bem pagas como um magistrado do Supremo Tribunal de Justiça. Deviam. Deviam. E este verbo ficou a aqui na minha cabeça a marinar até que se revelou numa grande dose de mau feitio, misturado com raiva e injustiça.
Claro que as Educadoras deviam ser mais bem pagas. Claro que EU devia ser mais bem paga! Mas estou farta do verbo dever e de ninguém fazer nada!
Sou eu que crio os vossos filhos, que lhes mostro arte, música, histórias, que os faço rir, sorrir, que lhes limpo as lágrimas, o nariz e o rabo. Sou eu que passo o dia com eles, que os vejo crescer, que me rio da coisas maravilhosas que dizem, que lhes mostro que o mundo não é perfeito, que lhes ensino o que é o olfacto e um quadrado. Sou eu que lhes dou colo quando estão doentes, que lhes canto os parabéns quando fazem anos, que os ajudo a preparar surpresas para o pai e para a mãe. Sou eu que os ensino a comer com faca e garfo, a distinguir a mão esquerda da direita e a contar até 20. Sou eu que lhes digo que partilhar é bom, que dar pode ser melhor que receber e que bater não é bonito. Sou eu que os preparo para a vida que aí vem!
Mas sim. Continuem a fazer salamaleques aos juízes, aos ditos "doutores". Continuem a achar que ganham de acordo com a sua responsabilidade. Paguem mundos e fundos a quem manda os gatunos para a cadeia, ser for legal fazê-lo e não ferir nenhum tipo de susceptibilidade.
O problema é que além de mal pagos, pouco respeitados e ignorados, os professores são os únicos profissionais que conheço que têm que levar material para o local de trabalho. Um médico não compra soro para ministrar aos seus pacientes, nem um pedreiro compra tijolos para concluir uma obra. Eu compro o que tiver que ser, pois de outro modo não tenho com que trabalhar da forma que eu acho que deve ser.
E continuem a achar que quem vive a vida dos vossos filhos devia ganhar mais. Porque um simples pensamento pode deixar-nos dormir de consciência tranquila...
Como já andamos todos aborrecidos com ao Rucas e as músicas da Carochinha, agora, na sala, vemos vídeos de orquestras, onde se toca música clássica. E é incrível como crianças de 2 anos ficam estáticas a absorver tudo o que estão a ver e a ouvir. Estou determinada a fazer daqueles putos malta culta e que pensa, pelo menos até chegar o dia da minha saída do Colégio.
Para quem tem filhos: façam a experiência em casa e surpreendam-se!
Eu não sou mãe. Não tenho filhos. Não sei se quero ter. Mas, neste momento, e graças às minhas colegas educadoras, já sei tudo e mais alguma coisa sobre partos e, em especial, dos partos dos 500 filhos que cada uma delas tem!
E eu, com o meu sorriso 36 na cara, penso para os meus botões: lamento não ter nenhuma história de placenta para partilhar, nem nenhum nanosegundo de agonia parideira.
Às vezes, até me sinto mal por ter 30 anos e ainda não ter reproduzido nada que se veja...
Se há coisa que me irrita são os estereótipos. E, infelizmente, a minha escolha profissional está mesmo no centro de um. Sou educadora de infância. Ninguém me obrigou a sê-lo, foi uma escolha bastante consciente. Gosto de estar com os mais pequenos e isso torna o dia-a-dia mais fácil. Entra-se na escola e esquece-se tudo o resto.
No entanto, toda a gente está à espera que uma educadora seja apenas isso. Isto é, seja pura e casta, e viva para a profissão. E isto a mim dá-me cabo da cabeça, porque eu não poderia ser mais o oposto a isto. Sou mulher. Gosto de sair à noite, beber copos e dançar. Fumo. Aprecio uma boa noite de sexo. E, no meio de tudo o que me caracteriza enquanto pessoa, (TAMBÉM) sou educadora de infância.
Todavia, tenho consciência que foi a própria classe profissional que assim se definiu. Como referi anteriormente, estou a trabalhar num novo colégio e, as horas de almoço são assim um suplício. As minhas colegas só falam em crianças, nos filhos delas, nos sobrinhos, nos alunos... enfim, uma verdadeira seca! São capazes de ser as pessoas mais desinteressantes que conheci nestes últimos anos.
E não há lugar para falar de absolutamente mais nada. Já tentei falar de outras coisas, mas foi impossível continuar. Có-cós, xi-xis e máquinas de bombear leite do peito, isso sim, dá para conversar os cinco dias da semana!
Estou lentamente a chegar à conclusão que eu é que estou mal, pois toda a gente está feliz assim.
Resta-me meter a viola no saco e ir tocar para outra freguesia!